12.09.2005

As 3 Vias do Clã

Eu creci num clã. Coisa rara nestes dias pos-modernos e globalizados com produtos para consumo dos vários níveis do ser que encarnamos todos os dias. Temos felicidade temporária vendida em várias poções mágicas para todos os gostos, fumos que nos fazem mal mas nos sabem bem no momento em que inspiramos, livros que vão ao encontro de todas as imaginações e gostos, imagens sequenciadas, programadas e isoladas que nos falam, dão prazer e fazem pensar, telepatias electronicas que se carregam com dinheiro virtual/imaginado e andam no nosso bolso, transportes tão rápidos e organizados que mais parecem teleportes... consciências globais em esquiço ... e apesar de tudo isto ainda há pessoas que não acedem a engrenar no mundo mágico que nos rodeia. Somos nós que estamos a fingir que somos deus, prevenimos castástofres e somos responsaveis pelo bom estado do nosso mundo. Esperemos que estas perspectivas tão Talkeineanas antes de mais se fortaleçam na mente de todos os que, só por terem acesso à razão, não conseguem encarar a força e o poder das poções, dos feitiços e dos encantamentos que só a cultura de um clã pode dar.

Gostava que este texto fosse lido como um resumo/esboço de alguns dos caminhos que não poderão nunca ser escritos ou explicados... Podem unicamente ser vividos numa comunidade. Como consequência ideal do fortalecimento dessa experiência espero que as perspectivas institucionalizadas cedam ao poder da imaginação privada.
Existem teorias recentes que ligam a imaginação aos estímulos do quotidiano e à "subliminalidade" inerente ao bolo publicitário com que somos bombardeados... Mas eu discordo dessa abordagem ao problema da origem. Sinto que a imaginação é resultado de uma sensibilidade extrema que cresce connosco quando vivemos num clã e absorvemos o conhecimento imaginativo/imagético e o potencial intelectualmente construtivo de todos os homens-magos-mulheres-feiticeiras que nos rodeiam. Eu tive a sorte ter ter várias vias diferentes presentes na minha educação e apesar de tudo sei que não sou um mago forte em nenhuma das disciplinas tradicionais. Também sei, no entanto, que absorvi o suficiente das várias áreas para me poder dar ao luxo de investigar o mundo imaginado/real/emocional/virtual/intelectual sem as restrições de quem muitas vezes é fortissimo numa "especialidade imaginativa" mas se encontra restrito a um sistema rigido que flui directamente do que absorveu de um certo mestre.


A Via do Humanismo

A escola da honra e da verdade é talvez a escola de magos mais forte no momento presente e aquela que opta por regeitar o poder público a abraçar o poder individual. Em virtude dessa sobriedade que lhe é inerente, acaba por benificiar, em certos casos, formas imaginativas negativas, como a da mentira e ambição (na política por exemplo). Esta escola de pensamento criativo tão dura mas fortificante foi-me transmitida pelo meu pai, o meu avô António e alguns professores de filosfia e é convencionalmente chamada de Humanismo. Nela residem valores extremos como o da vida e do conhecimento. Um humanista nunca estará satisfeito enquanto existir pena de morte. Sempre atento ao passado e aos valores nobres da justiça, o Humanista tem de frequentemente regeitar o seu prazer em favor de uma batalha feita de palavras e documentos que actualmente matam mais do que qualquer bomba atómica. Nesta escola aprendemos que só podemos acreditar no Homem como "cidadão do mundo" e no seu potencial. Para isso temos de começar com uma cultura clássica forte. Ler. Estarmos sempre atentos aos jornais. Procurarmos tardes peripatéticas e instituições que nos creditem para podermos desenpenhar certos papeis sociais e culturais. Envolve certemanete sermos críticos de tudo o que vêmos, mas a cima de tudo sermos o primeiro crítico de nós próprios. Para um humanista um escrito filosófico e o estudo do sistema em que vive faz dele e do seu próprio pensamento a única arma/ferramenta a que poderá alguma vez recorrer. Para se treinar tem de mergulhar em linhas extremas do rigor e da linguagem, treinar-se na arte da retórica para defender a Verdade como se um duelo de espadas se tratasse e acrescentar sempre linhas e notas aos sistemas mais complexos de leis: sejam eles científicos, jurídicos, literários ou artisticos... Em poucas palavras esta é via do guerreiro intelectual da Verdade. Da sua formação poderão fazer parte o estudo de uma ou várias das seguintes tradições: O principe de Maquiavel, Hagakure de Yamamoto Tsunetomo, Kriton de Platão e toda a cultura Jurídica subsequente (incluindo noções de economia, hermeneutica, direito constitucional e internacional, jonalismo e qualquer outra forma ou estudo da eloquência do discurso ético/estético), entre outras. O conceito de realização da vida do humanista é criar uma estrutura moral que adsorve uma dialética intensa com os sistemas que o rodeiam e encarar sempre a vida como uma ferramenta construtiva dessa "estrutura" cuja imagem mais perfeita é a Biblioteca de Babel do nosso amigo Jorge Luis Borges.


A Via do Amor

Sistema igualmente forte e talvez complementar é o que recheia uma casa de encantamentos fantásticos de prazer e bom ambiente. Nesta forma de magia há uma forte tradição na contenção espacial. É a forma de magia mais forte e intensa que conheço mas desenvolve o encatamento/conceito local de criação imaginativa do prazer. Desta escola fazem parte a conversa, a culinária, a música, a partilha, a inteligência emocional e a intuição. As artes em geral enraizam fortemente nesta formação. Esta corrente é magistralmente definida por personagens de Talkein como Tom Bonbadil. Mesmo na sua forma mais pública estas formas claramente dominadas pelo feminino (no dia presente) tomam normalmente as rédes de sistemas tão poderosos como a ideia social de "casa" e de "escola". Nestes sistemas constroiem-se todas as raizes de todas as outras formas de imaginação e magia. É crucial apercebermo-nos que estes são os poderes que dão vida aos nossos filhos (todos nós), aos nossos animais, à nossa felicidade e aos nossos sentimentos intuitivos mais profundos. Os grandes vultos da minha formação nesta área são obviamente a minha avó Carmo, a minha mãe e a Maria do Céu. São capazes das mais fantásticas poções e caldeirões que nos fazem sentir confiantes, fortes e ricos interiormente. É uma forma de magia altamente ritualizada normalmente dependente de momentos respeitados e venerados por todo o clã, como por exemplo: o Jantar, a conversa, o lanche e a partilha privadado dia presente e de todo o nosso interior mais confuso (porque este é acedido intuitivamente através de sinais impossiveis de controlar por qualquer mortal). Existem mitos nesta forma de existência e dele fazem parte encantamentos criativos como os tomatovos. Nunca antes vistos em qualquel livro de receitas foram criados por Vasco Viana Senior, usualmente visto como o mais intuitivo e criativo desta corrente imagética efervescente no inicio da sua vida. Deste mito fazem parte o seu poder sobre os animais, a relação estreita que tinha com galinhas, cães e a expressão de toda a sua força na culinária que entretanto se dissipou por questões obviamente muito pouco bem definidas. Nesta corrente encontramos todo o poder Xamanico e matriarcal e talvez por isso o Vasco se tenha perdido no meio do nevoeiro da maioridade. Já não faz parte do presente aquele que forrava a sua cama de musgo, fazia fugir qualquer cão e fluir toda magia intuitiva e contra-intuitiva.
No entanto temos mitos vivos desta via criativa. Para termos acesso a eles é imporante termos consciência que quando o espaço de acção destes encantamentos se espande toma a forma de acções sociais locais. O feitiço mais fantástico e inacessivel é adopção de vidas perdidas para as transformar nas crianças mais amadas do mundo... Sendo obviamente o casal mais famoso no Clã a minha Tia Graça e o meu Tio Fernando, por todos os resultados inacreditdáveis que atingiram com este encantamento determinante da "qualidade do mundo que todos conhecemos". Os meus tios criaram um "bem estar" tão forte à sua volta que hoje são o orgulho máximo de todos os que estão por dentro da forma local de magia mais forte alguma vez delineada. O valor e a força desta via imbatível em tudo o que diz respeito ao individuo, ao privado e à intimidade está numa só palavra cravada na única pedra que deu origem ao conceito de "casa": Amor.


A Via do Cantinho dos Sobrinhos

Finalmente na formação da minha imaginação foi crucial a exploração das formas linguísticas e pseudo-linguisticas da criatividade. Nesta corrente o rigor importa pouco pelo menos nos primeiros anos ou décadas de formação. Envolve viajar, ler e escrever em linguas estranhas ao Clã, criação de mundos por concretizar ou inconcretizaveis. Para dar dois exemplos de mestras de algumas qualidades que desenvolvi nesta área torna-se vital citar o nome das minhas tias Céu e Liu. A minha Tia Liu tem um método fantástico e ritmado para ajudar a nossa voz interior a fazer-se ouvir em linguas estrangeiras. Através dessas incursões não só desenvolvemos pensamentos muito mais profundos sobre linguagem, consciência e o Eu, como também somos imediatamente catapultados para uma potencial vida em terras onde tudo pode acontecer um dia mais tarde. Mais do que um plano B, para o caso de tudo correr menos bem, desenvolvemos capacidades de adaptação inacreditaveis a uma cultura que é emanada para nós nos detalhes e em conversas controladas por um relógio que dita que durante as horas seguintes apenas o sistema estrangeiro é viavel na comunicação dos acontecimentos interiores das nossas mentes. É a única forma de aprendizagem intuitiva da lingua e consequentemente da linguagem exterior à linguagem que usamos para pensar a linguagem.
Estranhamente a esta corrente engloba também todas as formas de transmissão de capacidades de criação de mundos profundamente criativos como o sotão que se expande para que caibam lá um Leão, um Burro, alces, coelhos, formas miticas de florestas, luzes multiplas e fantásticas da bretanha, Tarots, mantras, teleportes, todas as personagens de todos os filmes de ficção cientifica, Gaia, jogos e sistemas, desafios, páginas em branco e quartos desarrumados que partem de uma imaginação sonolenta por noites de animais e ideias apenas possíveis na mente de quem tem coragem para fazer viagens com o Darwin no Beagle às galápagos mesmo que apenas um pequeno trabalho escrito resulte desse processo aparentemente inconsequente e tão enriquecedor interiormente... é que isso até envolve limpar um convés primeiro apenas através da leitura e mais tarde abraçar projectos semelhantes como a viagem do Creoula à Madeira, onde a limpeza do convés não é tão literária e mais literal...

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