4.17.2005

Um até já à lingua portuguesa...

Amanhã começam as minhas aulas e vai deixar de ser fácil para mim manter o português e o inglês a acontecer ao mesmo tempo. Começo a tentar descobrir correspondências e por isso vou aqui deixar um tributo à queles que quanto a mim melhor escreveram em português nos últimos tempos. Aqui fica o poeta favorito do meu pai:

O Ciclista

O homem pedala, que pod'alma
com o passado a tiracolo,
ao ar vivaz abre as narinas:
Tem o por vir na pedaleira.


Alexandre O'Neil

E já agora o meu poeta favorito para ajudar à festa:

A Bicicleta

Lá vai a bicicleta do poeta em direcção
ao símbolo, por um dia de verão
exemplar. De pulmões às costas e bico
no ar, o poeta pernalta dá à pata
nos pedais. Uma grande memória, os sinais
dos dias sobrenaturais e a história
secreta da bicicleta. O simboloé simples.
Os êmbolos do coração ao ritmo dos pedais -
lá vai o poeta em direcção aos seus
sinais. Dá à pata
Como os outros animais.

O sol é branco, as flores legítimas, o amor
confuso. A vida é para sempre tenebrosa.
Entre as rimas e o suor, aparece e des
aparece uma rosa. No dia de verão,
violenta, a fantasia esquece. Entre
o nascimento e a morte, o movimento da rosa floresce
sabiamente. E a bicicleta ultrapassa
o milagre. O poeta aperta o volante e derrapa no instante da graça.

De pulmões à costas, a vida é para sempre
tenebrosa. A pata do poeta
mal ousa agora pedalar. No meio do ar
distrai-se a flor perdida. A vida é curta.
Puta de vida subdesenvolvida.
O bico do poeta corre os pontos cardeais.
O sol é branco, o o campo plano, a morte
certa. Não há sombra de sinais.
E o poeta dá à pata como os outros animais.

Se a noite cai agora sobre a rosa passada
E o dia de verão se recolhe
ao seu nada, e a única direcção é a própria noite
achada? De pulmões às costas, a vida
é tenebrosa. Morte é transfiguração,
pela imagem de uma rosa. E o poeta pernalta
de rosa interior dá à pata nos pedais
da confusão do amor.
Pela noite secreta dos caminhos iguais,
o poeta dá à pata como os outros animais.

Se o sul é para trás e o norte é para o lado,
é para sempre a morte.
Agarrado ao volante e pulmões às costas
como um peneu furado,
o poeta pedala o coração transfigurado.
Na memória mais antiga a direcção da morte
é a mesma do amor. E o poeta,
afinal mais mortal do que os outros animais,
dá à pata nos pedais para um verão interior.


herbeto helder

Parece que há uma ligação forte deste poema que eu adoro com uma serigrafia do Vespeira chamada: O Velocipoeta de Tavira.

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